Uma tarde em Swordia

Uma tarde calma em Swordia, Lucca e Sieg calmamente saboreavam um chimarrão na frente da casa deste enquanto suas esposas conversavam no lado de dentro.

– Sabe, irmão, tem duas coisas que há tempos eu quero te perguntar e nunca perguntei – comentou Lucca.

– E por que não perguntas agora?

– Ok, Ok. Primeira pergunta: como é possível existir chimarrão aqui em Noritvy?

– Bem, essa pergunta é bem fácil até. Nosso antepassado, o velho Genaro, quando chegou ao Brasil, se apaixonou pelo chimarrão e chegou até a aprender como preparar a erva-mate para usá-la no chimarrão. Quando se mudou para cá ele conseguiu que o mago Greyhund trouxesse algumas mudas e ele passou a cultivá-las aqui. É por isso que aqui o chimarrão é conhecido como “chá real”.

– Legal!

– E a segunda pergunta, irmão, qual é?

– Bem, não me leve a mal, mas porque você continua trabalhando como ferreiro? Uma coisa é fazer equipamentos para os membros da família, outra coisa é trabalhar regularmente como ferreiro, como você faz. Não é por dinheiro, porque sei que você juntou dinheiro quando era aventureiro e como campeão de Arlon. Tem uma pousada em Arlon, é meu sócio na Taverna aqui na cidade, em suma, podia ficar à toa apreciando a família.

– Pode parecer bobo o que falarei, irmão, mas para eu ser ferreiro é como ser um pintor, eu encaro meu trabalho como uma forma de arte. E eu me conheço muito bem para saber que não conseguiria ficar “à toa” como sugeristes.

– Faz sentido, eu acho que também não conseguiria ficar à toa, olhando para o teto o dia todo sem fazer nada.

Enquanto os dois irmãos conversavam e saboreavam a bebida, uma carruagem de aparência nobre se aproximou da casa, vindo da direção de Swordia. O condutor desta, ao ver a placa que indicava que aquela era a oficina de Sieg, parou a carruagem e deu duas batidinhas na lateral desta. Um outro criado, que vinha sentado junto do condutor, pulou do banco, colocou uma escadinha junto da porta da carruagem e abriu esta.

Do veículo desceram um jovem de cabelos escuros, vestindo trajes nobres e caros e um homem gordo e calvo usando trajes igualmente caros.

– Por acaso está é a oficina de Sieg, o ferreiro? – perguntou ele, com um certo desdém, sem se dar ao trabalho de desejar um bom dia ou uma boa tarde aos irmãos ali presentes.

– Boa tarde e sim esta é a minha oficina – retrucou Sieg. – No que posso ajudá-lo?

– Eu gostaria de ver algumas de suas peças. Sua fama como ferreiro chegou até a minha terra natal, o Reino de Oceanys e, como estava por perto, resolvi conferir se é tudo isso o que falam. E já adianto que dinheiro não é problema, não é mesmo, tio?

– Exatamente, dinheiro não é problema – concordou o gordo calvo.

Lucca puxou o irmão rapidamente para o canto:

– Você vai atendê-los? Com eles falando desse jeito contigo? – sussurrou Lucca para ele.

– Bem, irmão, cliente é cliente e muitos nobres aqui de Arlon são igualmente desdenhosos com aqueles que julgam inferiores. Já devias estar acostumado.

Sieg foi até eles e disse:

– Por favor, queiram me seguir até minha oficina para mostrar algumas peças que já tenho prontas.

Os dois nobres seguiram o elfo até a oficina. Lucca, não resistindo à curiosidade, os seguiu também mas tratou de ficar num canto, calado, enquanto o jovem nobre examinava as peças prontas com um certo desdém.

– De fato tens algum talento – falou o jovem e, naquele momento, ao escutar isso, Lucca teve que se conter para não fala nada – mas essas peças não são bem o que quero.

– E o que vossa excelência desejas? – retrucou Sieg com um sorriso.

– Algo mais personalizado, diferente mesmo, como a armadura que fizestes para um dos sobrinhos do rei de Oceanys usando uma liga incrivelmente leve.

– Bem, peças personalizadas são mais raras e mais complicadas de obter.

– Dinheiro não é problema – disse o nobre gordo. – Apenas siga o desejo do meu sobrinho.

– Não é questão de dinheiro, senhor, embora, de fato, minhas peças personalizadas costumem ser caras. Eu só faço peças especiais para aqueles que eu julgo dignas delas.

– Eu sou um nobre, herdeiro da segunda maior fortuna de Oceanys, é óbvio que sou digno.

– Sou obrigado a discordar, rapaz – retrucou Sieg. – Eu já estou vivo à um milênio e sei bem julgar as pessoas e, não, não és digno. Se desejas alguma das minhas peças aqui expostas, eu as venderei com prazer, mas não farei nada especial para alguém como ti.

– Como ousas falar assim comigo? Eu sou de uma família rica e influente e o meu tio aqui é um grande e poderoso mago.

– Exatamente, saiba medir as consequências, elfo.

– Bem, minha loja, minhas regras, peço que se retirem se não forem comprar nada.

– E se não quisermos sair? – provocou o jovem.

Lucca se adiantou para responder, mas seu irmão com um gesto o impediu e ele mesmo respondeu:

– Aí terei que chamar minha esposa – sorriu Sieg.

Os dois nobres começaram a rir da resposta do elfo. Esse não se abalou e sem mostrar qualquer irritação apenas gritou em direção à porta que dava acesso à casa:

– Querida, venha cá por favor.

Logo Liliana surgiu através da porta, acompanhada de Ardriel. Cada uma foi até seu respectivo marido

– O que foi, querido? – perguntou ela.

– Bem, eu me recusei a fazer uma peça personalizada para este jovem e o tio dele, depois que os convidei a se retirarem, digamos que me ameaçou pois ele seria um grande e poderoso mago.

– Seria não, ele é – insistiu o jovem.

– Meu marido foi bem claro: ele não lhes venderá nada, peço que saiam sem criar confusão – disse Liliana, olhando sério para os dois.

Diante do olhar da elfa, o nobre gordo ficou pálido, suou frio, deu uma olhada nos dois casais que ali estavam, agarrou o sobrinho pelo braço e falou:

– Vamos embora, sobrinho e, senhores, desculpem-nos pelo incomodo.

– Embora, tio? Desculpa?

– Cala a boca e vamos embora, garoto.

O gordo mago saiu pela oficina correndo (o máximo que podia), arrastando o sobrinho pelo braço, respirando forte e só se tranquilizou quando já se encontrava no seu coche, já a alguma distância da oficina.

– O que houve contigo, tio, para se acovardar diante de uma simples dona de casa? Tu és o mais poderoso mago de Oceanys, não deverias temer nada e ninguém.

– Definitivamente, sobrinho, eu tinha meus motivos para sair daquele jeito de lá.

– Me diga um ao menos, tio.

– Lhe direi dois: primeiro o meio elfo que estava junto do ferreiro.

– O que tem ele?

– Eu demorei a reconhecê-lo e só reconheci quando a esposa dele chegou. Aquele é o campeão de Arlon, o príncipe consorte de Erdan, Lukhz Bianchi e aquela ao seu lado era a princesa Ardriel, sua esposa.

– Tens certeza?

– Tenho. Não existem muitos meios elfos com quase uma milha real de altura (leia-se: dois metros) por aí e a esposa dele, bem, não tem como confundir Lady Ardriel.

– Está bem, e daí? Eles por acaso iriam nos agredir ou fazer qualquer coisa assim?

– Não, provavelmente não.

– Então não havia problema algum, tio e nem motivo para saímos de lá como covardes.

– Havia sim, a esposa do ferreiro.

– Aquela dona de casa?

– Sim, aquela dona de casa com uma aura magica absurdamente alta.

– Não pode ser tão alta assim, tio, não para lhe apavorar desse jeito.

– Acredite, sobrinho, a aura dela é tão intensa que sou capaz de jurar que ela seria capaz de destruir o nosso reino sem nem suar. E pessoas assim, bem, não são pessoas que queres ter como inimigos, não mesmo.

Ao mesmo tempo, Lucca, Sieg e suas esposas riam da cena.

– Normalmente sou eu que faço as pessoas ficarem assim, cunhada, mas depois de meia dúzia de gritos. Você os fez se borrarem só com um olhar – comentou Lucca, rindo.

– Que isso, Lukhz, exagero seu, eu só repeti o que meu marido havia dito.

– Enquanto liberava uma pequena amostra do seu poder, né amor? – provocou Sieg.

– Uma mínima amostra, tu queres dizer, né primo. Pois a aura de poder que a Liliana liberou não é nem um décimo do poder real dela – retrucou Ardriel.

– Exagero seu, minha amiga.

– Exagero nada, se tem alguém que eu não quero ver irritada comigo é você, cunhadinha – falou Lucca.

– Como se isso fosse um dia acontecer, Lukhz. Tu és, para mim, um irmão caçula, afinal, e, para a minha família, eu só mostro o meu lado bom – sorriu Liliana.

Depois daquela tarde, os dois nobres de Oceanys nunca mais passaram sequer perto de Swordia e passaram a ser muito mais educados com aqueles que julgavam inferiores.

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